Mato sem cachorro

Fico imaginando a seleção brasileira na mão de um interino até o Ancelotti se apresentar em junho de 2024. Se o interino for o Falcão, corremos o risco de colecionar derrotas como essa para o Senegal.
É uma alternativa ruim porque o amigo do Ancelotti é gerente de futebol do Santos e o time da Vila continua jogado às traças. E mais: Falcão já foi técnico da seleção, em 1991, e não aconteceu nada.
Outro problema: no final do ano, o Brasil joga pelas Eliminatórias contra Bolívia, Peru (fora), Venezuela, Uruguai, Colômbia (fora) e Argentina, com risco de perder pontos importantes na caminhada rumo à Copa.
O Falcão ou qualquer outro interino ficará por telefone discutindo com o Ancelotti convocações e esquemas de jogo. Três empates ou duas derrotas em seis jogos nas Eliminatórias e o italiano nem desembarca no Brasil.
Como o Ramon não dá por motivos óbvios, existem outros nomes para cargo de interino. O Kaká, que é outro amigo do Ancelotti, o Cerezo ou quem o Galvão indicar para o presidente da CBF.
Contra Senegal deu pra ver a falta de bons laterais, os problemas na marcação, a instabilidade do meio de campo e o fato de o nosso ataque depender do Vinícius Jr., que na seleção não é decisivo como no Real Madrid.
Ficamos, como sempre, dependendo do Neymar.
Cena típica de futebol varzeano

Quando eu joguei na várzea – há mais de 60 anos – existia uma dezena de campos de terra só na região do Alto da Mooca. Ainda muito novo, fui um meia-direita apenas razoável no segundo quadro (como se dizia na época) do Paulista da Vila Bertioga.
Nosso time era bem pobrinho. Tinha dois jogos de camisas surradas, duas bolas e meia dúzia de troféus pendurados no armazém do Betão, zagueiro-central do time principal. A gente se trocava na casa do técnico Spaca e íamos para os jogos no caminhão do lateral-direito Paçoca.
O pau comia dentro e fora de campo, mas nós – inconsequentes – não tínhamos medo de nada. Uma vez, saímos correndo a pé na Vila Formosa, onde o temido Caveira de Prata ameaçou o juiz com um enorme 38.
O VAR não existia. Nem os cartões amarelo e vermelho. As dúvidas eram resolvidas em debates acalorados entre o juiz, os capitães e dois ou três que falavam mais alto. A decisão nem sempre agradava e, muitas vezes, as partidas eram encerradas antes da hora.
Por tudo isso eu achei normal o técnico Abel e o argentino Calleri se estranharem no Morumbi. Lembrei do nosso futebol varzeano que, infelizmente, não existe mais.
Que saudade.
O Brasil é inverossímel
Quando a minha mulher Luisa lê as notícias sempre comenta que o nosso país não foi feito para amadores. Ela tem razão. Quando se trata de usar a criatividade, o brasileiro é imbatível, mas – infelizmente – quase toda a engenhosidade do nosso povo está sempre voltada para as coisas erradas.
Os jogadores de futebol acusados de participarem do esquema das quadrilhas que ganham dinheiro nos sites de apostas são apenas um reflexo do nosso povo, que é malandro desde a infância e daí a ser corrupto o passo é pequeno.
Eu até entendo algumas invenções dos brasileiros, tipo “Agora a Nasa Vem”, mas abomino a corrupção, principalmente na política e quando envolve o judiciário comprometido com gente poderosa.

Não consigo admitir o ex-governador Cabral, condenado a 500 anos, estar solto. E o ex-deputado e ex-ministro Geddel? Encontraram no seu apartamento malas com 51 milhões de reais, ele foi condenado a 14 anos e a Segunda Turma do STF derrubou a sua condenação.
O que me mais me espanta e revolta é ver os condenados da Lava Jato serem perdoados por juízes que nunca foram juízes, como o Tóffoli e agora o Zanin.
É a esculhambação geral.
Tem muita gente passando pano para o racismo

Neymar, o Fenômeno, Lewis Hamilton, Lula e o mundo inteiro apoiou Vinícius Jr., mas essas manifestações de solidariedade logo serão esquecidas e o crime continuará sendo praticado, principalmente na Espanha.
Em Valencia, foi a nona vez que o brasileiro sofreu com gritos de “macaco”, acompanhados da repugnante dancinha simiesca.
La Liga, Uefa e Fifa não se mexem.
Tirar o time de campo na hora da expulsão seria pedir demais porque os jogadores do Real e a torcida merengue pagariam um preço alto demais com a perda de posições no campeonato e a ausência na Champions do ano que vem.
Mas o técnico Ancelotti poderia ter saído junto com o brasileiro. Seria uma tomada de posição importante. Ele sempre diz que a situação é “inaceitável”, mas no fim aceita e, antes da expulsão, ainda fez o favor de convencer o atacante a continuar em campo no Mestalla.
Assisti ao jogo inteiro e pude acompanhar toda a palhaçada regida pelo fraquíssimo árbitro Bengoetxea, que ficou perdido em campo e não teve a sensibilidade de perceber que o jogador brasileiro estava abalado com as manifestações.
Eu via com bons olhos o Ancelotti comandando a nossa seleção, mas agora acho o italiano muito vaselina. Fico imaginando o Abel Ferreira se um jogador seu fosse vítima do racismo. Com certeza ele não ficaria mascando chiclete.
E se o Ancelotti não vier?
Muita gente dá como certa a contratação do italiano Carlo Ancelotti como técnico da seleção brasileira. Mas existe a possibilidade dele não aceitar o convite e, nesse caso, correm por fora Jorge Jesus, Abel Ferreira, José Mourinho e até Fernando Diniz.

Eu não contrataria nenhum deles. Prefiro o Zico. Ele foi um craque, é bem resolvido, boleiro, com passado limpo e conta com o apoio da imprensa brasileira, que costuma hostilizar o técnico da Seleção.
Como técnico, Zico foi assistente do Zagalo, treinou times japoneses, as seleções do Japão e do Iraque, Fenerbahçe e Olympiacos, entre outros.
Muitos vão alegar a forte ligação com o Flamengo, problema que o Jorge Jesus teria com o time da Gávea e o Abel Ferreira com o Palmeiras. Na minha opinião, ele pode superar isso, como aconteceu com o Telê e o Zagallo em relação a Fluminense e Botafogo.
Prefiro o Zico porque o Ancelotti sempre viveu num mundo diferente, que nada tem a ver com a América do Sul. E porque o Abel é nervosinho como o Diniz e o Mourinho mal humorado como o Dunga.
Outra coisa: não consigo ver o Ancelotti usando aquela camiseta colorida cheia de anunciantes em um treino pré-jogo da seleção brasileira no forte calor de Fortaleza ou de Campo Grande.
Coitado do Ancelotti

O estágio de desorganização do nosso futebol foi comprovado em Tânger, onde o Marrocos venceu o Brasil por 2 a 1. Perder foi super normal, já que os africanos terminaram em 4º no Catar, mas a CBF nunca poderia ter escolhido o time marroquino neste momento atual da seleção brasileira renovada e sem técnico definido.
Ramon Menezes foi um belo jogador do Vasco e ganhou recentemente como técnico o sul-americano Sub-20, mas daí a comandar a nossa seleção principal a distância é muito grande.
Além disso, os laterais Émerson Royal e Alex Telles são fracos. Para piorar, Andrey jogou mal porque Casemiro foi um horror e comprometeu todo o setor.
Vinícius Júnior e Paquetá pouco pegaram na bola e – além do Rony – só se salvou o Ibañez, o zagueiro do Roma que mostrou confiança e tranquilidade.
Ramon demorou para mexer e ainda fez trocas que eu não faria: Andrey por Rafael Veiga, Rodrygo por Vitor Roque, Rony por Antony e Paquetá por Yuri Alberto. Eu não tiraria o Rony e teria colocado o Veiga no lugar do Paquetá.
Peço licença para dar as notas aos jogadores, como eu fazia nos meus tempos de Jornal da Tarde: Weverton 6; Émerson Royal 3, Éder Militão 5, Ibañez 7 e Alex Telles 4; Casemiro 3, Andrey 4 (Rafael Veiga 4) e Paquetá 3 (Yuri Alberto – s/ nota); Rodrygo 6 (Vitor Roque 3); Rony 7 (Antony 5) e Vinícius Júnior 4.
Foi um momento mágico da minha vida
Tem muita gente falando sobre a retomada da democracia no Brasil sem ter a menor ideia de quando tudo começou. Poucos sabem que no início dos anos 80 um grupo de políticos do bem se reunia em São Paulo na Cantina Roma, na Rua Maranhão, no bairro de Higienópolis.
Bem antes da emenda Dante de Oliveira e dos famosos comícios em praças públicas, Ulysses Guimarães (na foto) propunha almoços para discutir a eleição direta para presidente. É esse movimento das “Diretas Já” que está sendo agora festejado pelo seu 40° aniversário.

Eu estive em dois desses almoços. Em um deles, foi discutida a nova Constituinte, anunciada mais tarde pelo Ulysses Guimarães, em outubro de 1988.
Participavam desses encontros na cantina o Ulysses, Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas, o governador na época, Franco Montoro, e Osmar Santos, a “Voz das Diretas”.
Lula apareceu no dia da histórica discussão sobre aceitar ou não a eleição indireta proposta pelo governo militar. Ele levantou furioso da mesa e foi embora, contrário à ideia. Eu dei razão a ele, o grupo não.
Naqueles dias, a ditadura era sombria e perigosa. Lembro de quando o saudoso Mário Covas pediu para o gerente da cantina afastar um dos garçons que parecia ter ouvidos de Judas.
A simplicidade é a maior amiga da perfeição

Pelé nos deixou há pouco tempo e os jovens continuam se perguntando se ele foi mesmo maior do que Messi, Cristiano Ronaldo ou Maradona.
Na vida pessoal, o Rei não foi lá essas coisas, mas dentro de campo ele não pode ser contestado. Ganhou três Copas, foi campeão do mundo com o Santos duas vezes e marcou mais de 1.200 gols com o pé direito, com o esquerdo, com chutes fortes, chutes colocados, cobrando faltas e pênaltis. Pelé cabeceava como ninguém (ver foto) e fazia tudo isso sempre com muita simplicidade.
O Rei não complicava. Desde os anos 60, quando meu pai me levava para assistir aos jogos do Santos, e depois, como jornalista esportivo, eu sempre notei a maneira como ele simplificava as coisas. Um exemplo: quando não tinha mais saída, usava as pernas dos adversários nas suas tabelinhas.
Pelé não perdia tempo com malabarismos. Escolhia sempre o caminho mais simples. Nas suas arrancadas, ele dava “canetas” seguidas em dois ou três marcadores para ganhar tempo e espaço, nunca para humilhar os adversários.
Se o Rei tinha algum defeito no futebol? Tinha sim. Ele não era bom nas “embaixadinhas”, sempre as evitava em público. Talvez por elas soarem exibição, o que não combinava com seu futebol programado só para marcar gols. Simples, não?
Experiência inesquecível
Lembro bem do dia em que entrei pela primeira vez na redação da revista Bondinho, localizada no primeiro andar de um prédio paulistano decadente na esquina das ruas Avanhandava e 9 de Julho.
Senti, pela primeira vez, o gostinho de ser jornalista.
O Bondinho foi fundado nos anos da ditadura militar por jornalistas que tinham acabado de deixar a revista Realidade. Era uma publicação gratuita, distribuída em todos os supermercados Pão de Açúcar.
Naquele dia, na metade de 1971, conheci jornalistas famosos, entre eles, Sérgio de Souza e Woyle Guimarães. Nem sonhava que depois iria trabalhar com Fausto Silva no jornal, no rádio e na tevê. Muito menos, imaginava que seria chefe na equipe de Osmar Santos.
Por causa de uma aula de fotografia no curso de Comunicações da FAAP, acabei conseguindo o estágio no Bondinho.
Durante três meses fui orientado pela diretora de fotografia, a badalada Cláudia Andujar. Com minha Pentax, acompanhei repórteres e tive fotos publicadas, uma delas, no Teatro Ruth Escobar. Dias depois, a peça foi censurada.

Lembro de tudo o que foi discutido naquela reunião e o que se transformou na reportagem de capa (foto). A sugestão foi do publicitário Carlito Maia, criador da Jovem Guarda e de slogans famosos para o Lula. A ideia: o cantor Roberto Carlos, já muito famoso, deveria fotografar, ele mesmo, diante de um espelho, algumas cartas de amor que recebia.
Traído por Roberto Carlos e pelo PT, Carlito começou a beber. Bebeu muito até se tornar relações públicas da TV Globo, onde acabou se tornando um grande amigo meu. Osmar Santos e eu aprendemos muito com ele, principalmente como defender a liberdade e a democracia.
Tudo isso – pasmem – aconteceu há mais de 50 anos.
Velório ainda mais triste sem os “amigos” do Rei

De gente mais famosa, passaram pela Vila Belmiro só Mauro Silva, Clodoaldo, Careca, Zé Roberto, Elano, Neto, Milton Neves e Osmar Santos (foto). Numa cadeira de rodas, o narrador consolou Edinho e deu um grande exemplo de educação, respeito e gratidão.
Neymar decepcionou ao não pegar um dos seus jatinhos para dar adeus ao Rei. Há alguns dias, já no hospital, Pelé chegou a cumprimentá-lo pelo recorde de gols na seleção ter sido igualado.
Outros craques deveriam estar presentes no velório do Rei. Onde se enfiaram os dois Ronaldos, Romário, Kaká, Roberto Carlos, Cafu, Gérson, Tostão, Rivaldo, Rivellino, Zico? Segundo o ex-jogador e hoje comentarista Neto, esses “ídolos” não faltariam se estivessem pagando um bom cachê.
Caio Ribeiro disse que a época do ano não permitiu a presença de jogadores famosos e Casagrande justificou a atitude dos campeões do tetra e do penta com a história de que eles ficaram magoados com o Pelé comentarista. Um passou o pano e o outro jogou confete nele mesmo ao dizer que o Romário nunca aceitou as críticas do Rei e dele.
O pentacampeão Marcos foi ainda mais infeliz. Disse que não foi até Santos porque ninguém foi no velório dos seus pais.
E o nosso querido Galvão Bueno, hein? Ele explicou a sua ausência pelas redes sociais alegando compromissos profissionais no Japão.
O Neto tem razão.